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IDENTIDADE, MEMÓRIAS, CULTURA, DIVERSIDADE CULTURAL, DESIGUALDADES SOCIAIS...

segunda-feira, 18 de abril de 2011


Espaços e processos pedagógicos na escola




Alessandra M. T. Domeniquelli

Partindo da premissa que todo espaço construído, pensando e organizado não é neutro, e ainda, que existem várias facetas e diferentes concepções dependendo da área e campo de estudo sobre o espaço (físico, sideral, político, arquitetônico) é preciso considerar que o espaço carrega consigo visão de mundo e concepções – nem sempre conscientes - de quem o elaborou, projetou e edificou, portanto os espaços são ligados a uma função.

Em nossas discussões e reflexões no curso de Pedagogia, focamos o trabalho no espaço arquitetônico, espaços produzidos nas relações que se materializaram em formas para exercer diversas atividades, espaço esse que produz sensações ligadas a sua função, tem seus próprios significados culturais, psicológicos, emocionais, entre outros.

Cada espaço, nesse sentido, apresenta características que supõe ser planejado, dinâmico, amplo, estruturado, organizado para uma função e/ou uso e que possibilita relações entre as pessoas. A atividade humana acontece num determinado tempo e espaço, numa época, num contexto, que comunicam ideias e comunicam concepções. Dessa forma, o espaço e tempo estão intimamente ligados, envolvendo as pessoas e, no caso desse estudo, a atividade docente.

No ambiente escolar, o espaço e tempo se constituem no sentido de fazer com que o aluno aprenda e o professor ensine!  Será que ambos promovem a aprendizagem e transformam o sujeito nesses espaços e tempo que habitam? Que escola é essa e como ela está organizada? Que concepções estão por traz desse modelo de escola brasileira?

Os vídeos “The Wall” de Pink Floyd (parte 1 e 2) nos provocam a pensar sobre que escola ainda temos e que escola queremos...
Disponível em: Parte 1 - http://www.youtube.com/watch?v=M_bvT-DGcWw&feature=related (acesso em 02/03/2011) e Parte 2 - http://www.youtube.com/watch?v=LUASiDg-kg4&feature=related (acesso em 02/03/2011).

O Modelo de escola apresentado nos vídeos instiga refletir sobre essa escola inspirada no modelo fabril e militar. Revela o espaço tradicional, carregado de sentidos e de teorias, concepções de época, de cultura, de sociedade, portanto de espaço... O professor oprime, subestima, envergonha a criança na escola, é autoritário! Tudo muito controlado, ordenado, alunos em fila, numa marcha, no mesmo passo, no mesmo tempo, repetindo, onde as máscaras demonstram que as crianças não tem identidade própria, precisam ser iguais, aceitar pacientemente.

A escola brasileira foi concebida e inspirada pelo modelo arquitetônico fabril das indústrias, porque o objetivo da educação era preparar para o trabalho, que incorporava na sua organização de espaço e tempo práticas da indústria. Todavia, me pergunto: Por que muitas de nossas escolas ainda se organizam dessa forma? Por que os professores e alunos ainda se sujeitam a essa organização?

A educação como encontro de seres humanos se encontra na vida humana e pode estar alicerçada em várias concepções e tendências pedagógicas, dependendo do momento histórico e desafios de cada época, consequentemente as diversas concepções vão intervir em toda a complexidade institucional. Em algumas instituições de ensino formal, ganha conotações de transmissão de saberes e ensinamento de técnicas, ficando restrita a conhecimentos presos aos currículos escolares e à tarefa do fazer social. Dessa forma, os padrões se efetivam nas escolas sobre o que cada um deve aprender e como aprender. A Educação carregada de valores culturais tece nas instituições de ensino as relações entre professores e alunos, perdendo na maioria das vezes o seu sentido mais amplo e completo, que vai além da formalidade, vai em busca do verdadeiro encontro educador e educando. O ser humano, no exercício da experiência cultural vive o conflito entre o comportamento adquirido, os processos de relação pedagógica e a autorrealização como ser humano.

O conhecimento é fragmentado em idade, etapa, parte, ano, série, semestre, prova, estabelecido em diretrizes que indicam e determinam o melhor momento para se aprender e avaliar o que foi aprendido. Fortalece-se em um esquema que, nada, ou quase nada, condiz com a realidade educacional. A falta de sentido se firma e se mantém em muitos ambientes escolares!

A Escola de Educação bancária (depósito e saque) como o mestre Paulo Freire definiu, o professor ditador e alunos manipulados neste ambiente representa o confinamento intelectual e social do sujeito, quanto menor relação com o mundo exterior, mais fácil dominar!
Na sociedade contemporânea onde está a atividade de articular o processo com a vida? A escola tradicional que falamos não é só passado, são práticas presentes e atuais em muitas situações de ensino, porém sabemos que não cabe mais um espaço arcaico e tradicional em nossa contemporaneidade.

Para isso, é preciso enxergar que a organização do espaço escolar e as práticas que se efetivam dentro das instituições escolares precisam mudar, promovendo os princípios da autonomia, movimento e interação. O aluno plugado no mundo (celular, notebook, games etc.) tem saberes e experiências reais, bem como os professores, essas saberes trazidos para os espaços e tempos escolares podem tornar-se processos ricos de aprendizagem e trabalhados no sentido da construção, possibilitando um refazer como sujeitos históricos da sociedade e na transformação, por meio de estratégias didáticas. O ser humano aluno e o ser humano professor – seres em sua totalidade (corpo, razão, emoção e espiritualidade) uma inteireza humana – exige reconhecimento, implicação, sensibilidade. Todavia, a forma como o espaço escolar será organizado envolve as ideias e concepções de educação que diretores, coordenadores pedagógicos, professores, auxiliares de educação e pessoas diretamente ligadas à criança, têm de desenvolvimento infantil. Portanto, oportunizar aprendizagem nesta concepção de liberdade significa estar aberto e consciente sobre o meu próprio fazer pedagógico implicado com o projeto de transformação social.

Na esperança de que as contribuições dessas reflexões possibilitem repensar os espaços, tempo e processos de aprendizagem na escola e uma relação pedagógica autentica, reconheça que o espaço se projeta e se constrói no “fluir da vida” (VIÑAO e ESCOLANO, 1998, p. 61) com mais sentido para os sujeitos implicados nesse processo, onde o unir forças, os múltiplos parceiros, a cooperação entre família, escola e sociedade sejam capazes construir um jeito novo de educar.

Por isso, a proposta de elaboração do Blog seja significativa aos veteranos do curso de Pedagogia - EAD, porque não acreditamos e não queremos participar de relação fabril de produção homogênea, massificada, seriada, queremos que o que fazemos na escola e o que produzimos na escola, não fique só na escola, mas atravesse os muros, extrapole as paredes, esteja no mundo, para expressar o que vocês conseguiram construir no curso com consciência do porquê e para quê.
Espero que estas considerações possibilitem transparência no trabalho educativo, responsável com as necessidades de toda a comunidade acadêmica e consciente das condições para um trabalho efetivo na escola. Durante minha pesquisa de mestrado sobre “A relação pedagógica na tutoria a distância: um estudo a partir do curso de Pedagogia” os estudos concluíram que  podemos ser importantes parceiros nas mais diversas e plurais perspectivas de interação e colaboração, partilhando memórias, vivências e saberes, por meio das relações estabelecidas, tendo como ganho uma prática autônoma, inteira e verdadeiramente significativa na área de conhecimento, que poderá possibilitar projetos e, quem sabe, futuras iniciativas para o sincero e verdadeiro reconhecimento da profissão docente na construção de autoria.

Vale dizer que a relação pedagógica se constrói no movimento entre os sujeitos, eu preciso do outro para exercitar essa condição de sujeito. A sala de aula – seja presencial, ou seja virtual – é o espaço da própria relação (relação com). Como Freire aponta, a educação autêntica se faz na relação de “A com B” numa interação (eu-outro), não deve ser de “A para B ou de A sobre B”. O educador precisa politizar a sua relação e desalienar o que foi e é vivenciado. Dessa forma, a construção do conhecimento acontece quando a educação é problematizadora (educação libertadora), um ato cognoscente mediatizado para a reflexão crítica entre os sujeitos, entre educador-educando.

O maior desafio atualmente é resgatar o significado da existência humana e contribuir de forma verdadeiramente “inteira” para a formação de professores. Nosso mundo globalizado, contudo sem sentido, clama por mudanças e transformações, e a escola lócus para o encontro entre pessoas precisa transformar pensamentos em ações e movimentos numa construção mais solidária.

Finalizo esse pequeno texto com a letra de Raul Seixas, “Preludio”:
Sonho que se sonha só
É só um sonho que se sonha só
Mas sonho que se sonha junto é realidade.

Bibliografia

ARDOINO, Jacques. Abordagem multirreferencial (plural) das situações educativas e formativas. In: BARBOSA, Joaquim G. Multirreferencialidade nas ciências e na educação. São Carlos: EdUFSCar, 1998.

BARBIER, René. A escuta sensível na abordagem transversal. In: BARBOSA, Joaquim G. Multirreferencialidade nas ciências e na educação. São Carlos: EdUFSCar, 1998.

DOMENIQUELLI, Alessandra M. T. A relação pedagógica na tutoria a distância: um estudo a partir do curso de Pedagogia. 2010. 201p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2007. 36ª ed.

_____________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005. 42ª ed.

Guia de Estudos da Pedagogia "Planejamento, processos pedagógicos, problemas contemporâneos. UMESP. São Bernardo do Campo: Editora do Autor, 2011. (Cadernos didáticos Metodista - Campus EAD)

SANTOS NETO, Elydio dos. Por uma educação transpessoal: a ação pedagógica e o pensamento de Stanislav Grof. São Bernardo do Campo/SP: Editora Metodista; Rio de Janeiro/RJ: Lucerna, 2006. (Coleção Educação & Transdisciplinaridade; v.4)

______________________. O encontro educador-educando: tensões, angústias... e fundamentos para possíveis respostas. In: ALMEIDA, J. S. et all (org.) Educação e prática docente: as interfaces do saber. Franca/SP: Unifran, 2005.

VIÑAO, Antonio; ESCOLANO, Augustin. Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. Rio de janeiro: DP & A, 1998.

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